5.4.4.3 Papel dos PCNs na biomineralização da dentina (SIBLINGs)
Proteínas ácidas siderais foram reconhecidas como sendo activas na promoção ou inibição da deposição de minerais. Um grupo de proteínas que recebe maior atenção é a pequena família de glicoproteínas ligadas à integrina N (SIBLING). Este grupo de proteínas constitui o principal grupo de PCNs tanto no osso quanto na dentina, e inclui: osteopontino (OPN), sialoproteína óssea (BSP), proteína de matriz dentina 1 (DMP1), sialofosfoproteína dentina (DSPP) e fosfoglicoproteína extracelular de matriz (MEPE) (Fisher et al., 2001). Todas estas proteínas mostraram a capacidade de se ligar a alguns componentes ou células ECM específicas, e a capacidade de interagir e ligar Ca2 + iões. Elas são intrinsecamente desordenadas, com estruturas relativamente aleatórias e uma conformação aberta que lhes permite interagir com uma variedade de outros componentes da matriz (Evans, 2003; George e Veis, 2008). Sua importância na mineralização vem de estudos nos quais a falta de SIBLINGs individuais causa mineralização defeituosa in vivo (Maciejewska e Chomik, 2012; Xiao et al., 2001; Zhang et al., 2001). No entanto, foi sugerido algum nível de redundância em sua função, pois nenhuma das proteínas induziu supressão total da mineralização.
Estudos transversais demonstraram que DMP1 é uma proteína multifuncional com papel relevante na diferenciação odontoblástica e eventos de nucleação mineral (He et al., 2003a; He e George, 2004; Qin et al., 2007). Estudos usando DMP1 recombinante (rDMP1) demonstraram que a proteína sofre auto-montagem em uma configuração de folha β somente na presença de cálcio (He et al., 2003a,b). Este achado levou ao conceito de que a oligomerização do DMP1 estabiliza temporariamente os precursores de fosfato de cálcio recém-formados, seqüestrando e evitando sua agregação e precipitação posteriores (He et al., 2005). Além disso, o mapeamento do peptídeo revelou locais de ligação do colágeno no terminal DMP1 C (He e George, 2004). Experiências posteriores demonstraram que, na presença de colágeno tipo I, tanto o rDMP1 de comprimento total quanto o DMP1 nativo fosforilado (p-DMP1) induzem nucleação e crescimento de HAp, enquanto o domínio N-terminal inibiu a formação de HAp e estabilizou a fase mineral amorfa (Gajjeraman et al., 2007). Curiosamente, o DMP1 foi localizado na dentina peritubular, que carece de fibrilas de colágeno. Esta descoberta sugere que, in vivo, a DMP1 pode estar envolvida na organização mineral fora da fibrilha colágena e na mineralização da dentina peritubular (Beniash et al., 2011). Outros estudos irão contribuir com mais informações para melhor compreender a função, mas é provável que a função DMP1 seja controlada pelo seu estado de fosforilação. Portanto, a DMP1 pode ter um papel duplo envolvendo inibição do crescimento dos cristais e promoção da nucleação mineral.
DSPP é altamente expressa em odontoblastos e transitoriamente expressa em ameloblastos (Begue-Kirn et al., 1998; D’Souza et al., 1997). Esta proteína é clivada em dois produtos principais: dentina sialoproteína (DSP) derivada da DSPP N-terminal e dentina fosfoproteína (DPP), ou fosforina, da região C-terminal. Mutações no gene DSPP têm sido associadas à dentina imperfeita tipo II/III humana, sugerindo seu envolvimento no processo de mineralização (McKnight et al., 2008). De fato, estudos com ratos knockout (KO) demonstraram que a deleção ou modificação do desenvolvimento da dentina afetada pela proteína (von Marschall et al., 2012) e mineralização, gerando defeitos similares à dentina humana imperfeita III (Sreenath et al., 2003). O DPP, um dos produtos de clivagem, foi descoberto muito antes do seu precursor (Veis e Perry, 1967) e é de fato o PCN mais abundante na dentina ECM, sendo responsável por 50% dos PCNs (MacDougall et al., 1985). O PCD é altamente expresso e secretado diretamente na frente de mineralização da dentina por odontoblastos polarizados (D’Souza et al., 1997). Esta proteína é considerada como portadora de fosfato, já que 85-90% dos resíduos de Ser são fosforados (Butler et al., 1983; Fujisawa e Sasaki, 1983; Sabsay et al., 1991). Ensaios de ligação do DPP às fibrilas de colágeno mostraram que o DPP se liga a uma faixa específica na região do buraco de colágeno, o que sugere uma possível regulação da deposição mineral dentro da região do buraco (Traub et al., 1992). Além disso, os altos níveis de Asp e serina fosforilada tornam o DPP uma macromolécula muito polianiônica que liga grandes quantidades de cálcio com afinidade relativamente alta. Expresso por odontoblastos e secretado no ECM, o fragmento de DSP é menos abundante. Estudos utilizando ratos DPP-KO condicionados para isolar o papel da DSP mostraram um resgate parcial do fenótipo com formação de volume significativo de dentina, mas com menor densidade mineral. Com base nesses resultados, os autores sugeriram que a DSP pode estar implicada no início da mineralização dentina (Suzuki et al., 2009).
Outras proteínas menos investigadas também podem desempenhar papéis importantes. Na dentina, entretanto, uma função potencial durante a dentinogênese ainda está por ser elucidada. Por exemplo, a BSP, inicialmente isolada do osso, apresenta fortes propriedades de ligação Ca+ 2 (Zurick et al., 2013). In vitro, a BSP tem demonstrado promover a nucleação HAp pela interação com colágeno (Baht et al., 2008). Da mesma forma, OPN é uma proteína ácida carregada negativamente que contém uma fracção ligante de colágeno (Lee et al., 2007). Vários estudos in vitro revelaram que a OPN tem um efeito inibitório ou intensificador na formação de HAp dependendo do seu nível de fosforilação e concentração (Gericke et al., 2005; Hunter et al., 1994, 1996; Pampena et al., 2004). Um dos mecanismos que explicaria o seu efeito inibitório é baseado na adsorção dos grupos de fosfato ao cristal de HAp, impedindo o crescimento futuro do cristal, mas a interação específica ainda não é totalmente compreendida (George e Veis, 2008). Com um papel putativo na homeostase do fosfato, o MEPE é altamente expresso em odontoblastos diferenciados e tem demonstrado inibir a mineralização (MacDougall et al., 2002). Um motivo rico em ácido serínico/ácido parasitário localizado no terminal C do MEPE foi identificado como um forte inibidor da mineralização após clivagem enzimática (Addison et al., 2008; Salmon et al., 2013). Um estudo recente relatou localização anormal do MEPE e da OSP na dentina humana em pacientes com raquitismo de X-hipofosfatemia (XLH), sugerindo um papel de ambas as proteínas na mineralização deficiente da dentina observada no XLH (Salmon et al., 2014).
Overall, todas essas proteínas são agentes ativos no processo de mineralização, mostrando papéis multifuncionais que irão afetar a mineralização. Estas proteínas ou atuarão para inibir ou promover a mineralização dependendo de sua concentração, seu estado fosforado, o grau de outras modificações pós-tradução, e se estiverem presentes em solução ou ligadas a algum componente ECM.