DISCUSSÃO
Neste estudo revisamos vários casos de PLA na dentição primária para confirmar grande parte da controvérsia sobre suas características clínicas, tais como padrões de esfoliação precoce e câmaras de polpa ampliadas.17-19 Constatamos que as características predominantes dessa PAB nessa criança afro-americana são: afetar principalmente os primeiros molares primários maxilares, mandibulares ou ambos, possivelmente iniciando-se nos primeiros molares primários, devido ao padrão de perda óssea mais grave nesses dentes, e progredindo rapidamente (principalmente dentro de um ano) para o segundo molar primário. Essa progressão não ocorre com frequência tão rapidamente na dentição permanente afetada1. Uma possível razão para essa iniciação no primeiro molar primário pode ser a mesma razão pela qual a PAE também começa no primeiro molar permanente: o primeiro molar primário é também o primeiro dos molares a irromper na cavidade bucal e a acumular placa dentária e a desencadear uma resposta inflamatória hospedeira. Uma microbiota específica, bem como uma resposta única do hospedeiro a essa microbiota, inicia então o processo de quebra desses dentes20 e, de alguma forma, o hospedeiro prende esse processo em um ponto, apenas em alguns casos continuando sua progressão para outros dentes da boca. Entretanto, isso tem sido relatado apenas na dentição permanente e pouco se sabe sobre o processo de progressão dessa doença na dentição primária1. Relatamos aqui, pela primeira vez, um envolvimento muito comum (30 dos 33 casos) mais grave do primeiro molar primário com envolvimento e progressão da doença para o segundo molar primário, já há um ano, o que nunca foi relatado antes, embora casos envolvendo tanto o primeiro molar permanente quanto o primário tenham sido, de fato, relatados anteriormente. Além disso, a razão pela qual poderia haver rápida progressão da doença para o segundo molar primário, o que geralmente não acontece na dentição permanente, é o fato de que os segundos molares primários geralmente irrompem dentro de cerca de um ano após os primeiros molares primários. Pelo contrário, os segundos molares permanentes irão entrar em erupção muito mais tarde, aproximadamente 6 anos após a erupção dos primeiros molares permanentes. Assim, nós colocamos aqui a hipótese de que o hospedeiro pode ser capaz de deter a progressão desta doença na dentição permanente antes que os segundos molares eclodam, confinando assim a doença apenas aos primeiros molares permanentes. A erupção relativamente rápida dos segundos molares primários após o primeiro molar primário pode ser a razão pela qual a progressão ocorre nessa dentição.
Em todos os nossos casos de PAB em dentição primária diagnosticados até o momento, encontramos apenas 1 caso com envolvimento canino concomitante.
Outra característica que encontramos nessa doença foi um padrão atípico de reabsorção radicular (não uma reabsorção apical fisiológica comumente encontrada nessa idade). O que observamos aqui com bastante frequência foi um padrão de reabsorção radicular externa (na maioria dos casos) ou interna, bem como uma perda óssea periodontal predominante em comparação a uma reabsorção radicular fisiológica algo “retardada” das raízes afetadas, levando a uma esfoliação precoce da dentição primária devido à perda óssea periodontal e não ao processo biológico de reabsorção radicular apical. Este padrão diferente de reabsorção radicular já foi relatado anteriormente. 5
Muita controvérsia existe sobre o(s) mecanismo(s) de reabsorção celular do osso em relação aos dentes. Apesar de se acreditar que os ‘odontoclastos’ possuem propriedades comuns aos ‘osteoclastos’, os mecanismos regulatórios que medeiam a reabsorção dentária odontoclástica podem diferir da reabsorção óssea osteoclástica. De fato, diferenças importantes na atividade odontoclástica e osteoclástica têm sido relatadas na literatura: a) o tamanho celular – os odontoclastos são menores e têm menos núcleos quando comparados aos osteoclastos21,25; b) regulação por fatores sistêmicos – a reabsorção dentária, ao contrário da reabsorção óssea, não é regulada pelo hormônio paratireóide (PTH)27; e c) resposta às drogas – a indometacina parece melhorar a reabsorção radicular, mas não interfere na reabsorção óssea durante a movimentação dentária ortodôntica.28,29 Assim, o padrão incomum de reabsorção dentária em pacientes com PABE corrobora os achados de pesquisas anteriores de que osteoclastos e odontoclastos não respondem de forma idêntica aos mediadores inflamatórios. Nossas observações clínicas e radiográficas indicaram que padrões atípicos de reabsorção radicular externa ocorrem e que a reabsorção radicular apical/fisiológica parece ocorrer mais lentamente, enquanto a reabsorção óssea circundante ocorre de forma mais agressiva ao redor dos dentes primários em pacientes com PABE. Tem sido relatado um aumento da atividade odontoclástica na câmara pulpar dos dentes primários, mesmo na ausência de trauma ou cáries30, os fatores etiológicos mais comuns da reabsorção radicular interna, o que também temos mostrado em alguns casos aqui. Uma hipótese plausível é que os traços imunológicos e genéticos associados à PAE têm um papel perturbador na coordenação da atividade ‘clássica’ celular. O processo inflamatório em curso durante a PAE é conhecido por acelerar a atividade osteoclástica e pode de fato acelerar a reabsorção radicular.22,31 Entretanto, em uma situação patológica como a apresentada neste estudo, pode desencadear um desequilíbrio da atividade clássica, dominada pela atividade osteoclástica, enquanto a atividade odontoclástica é interrompida, causando ou atraso da reabsorção radicular fisiológica, ou reabsorção radicular externa ou interna patológica, como mostrado neste relatório. Assim, a excessiva atividade osteoclástica induzida pelo processo inflamatório da doença periodontal pode, de fato, acelerar a reabsorção radicular, como relatado anteriormente22, mas, neste caso, de forma patológica. O fato de um processo inflamatório agressivo, quase agudo, estar ocorrendo ao redor desses dentes tão cedo na vida, pode servir como um gatilho para essa atividade anticlássica disruptiva ao redor das raízes primárias. Entretanto, os mecanismos pelos quais a diferenciação de osteoclastos e odontoclastos e qual a atividade dominante ocorrem não são totalmente compreendidos.22 Relatos anteriores corroboram, de fato, que a PAE está associada à esfoliação precoce dos dentes primários.5,7,8 A maioria desses relatos, no entanto, mostrou que a perda do dente está realmente relacionada à perda de osso ao redor das raízes e não à reabsorção radicular acelerada, o que também foi mostrado em alguns de nossos casos aqui.
Outro tópico controverso é o aumento das câmaras de polpa, como característica da PAB afetou os molares primários. Page et al. relataram câmaras de polpa anormalmente grandes e diferentes padrões de reabsorção radicular em pacientes com perda óssea avançada na dentição primária. Sabe-se que há um aumento da atividade odontoclástica na câmara pulpar dos dentes primários, mesmo na ausência de trauma ou cárie30, os fatores etiológicos mais comuns da reabsorção radicular interna, e essa poderia ser a causa dessa entidade observada aqui. Assim, alguns dos casos de câmara pulpar ampliada aqui encontrados poderiam ser resultado de processo interno de reabsorção radicular nesses dentes circundados por um processo inflamatório.
Por último, embora todas as crianças do presente estudo tenham sido consideradas sistemicamente sadias, algumas delas estavam em estágio pré-puberdade ou puberdade. A influência dos hormônios sexuais no processo inflamatório da PAB é desconhecida neste momento. Entretanto, sabemos que os hormônios sexuais podem influenciar a inflamação durante a puberdade32 e também durante a gravidez.33 Outro fator sistêmico que poderia ser considerado aqui, especialmente nos casos associados à reabsorção radicular e à PABE, são os níveis séricos de fosfato. Embora nenhuma criança tenha sido previamente diagnosticada com hipofosfatemia, níveis mais baixos de fosfato foram associados a alguns casos de PLA, 5 bem como à reabsorção radicular. 34
Uma possível limitação deste estudo é a determinação clara da perda dentária precoce através da análise radiográfica. A faixa etária da perda dentária não é bem definida e varia tremendamente individualmente e é coordenada por muitos fatores. 35 Portanto, muitos dos casos deste estudo (n=7) foram considerados indeterminados para essa característica. Apenas consideramos a esfoliação precoce quando houve clara perda precoce do dente primário de acordo com a idade e também a formação e aproximação do rebento dentário permanente por baixo.
Em conclusão, relatamos características clínicas encontradas em uma população afro-americana diagnosticada com PAB na dentição primária, incluindo o primeiro e segundo molares primários mais afetados, com um possível início no primeiro molar primário, e um padrão incomum de reabsorção radicular ao redor dos dentes afetados pela PAB, incluindo principalmente reabsorção radicular externa e alguns casos de reabsorção radicular interna, não associados ao padrão normal/biológico de reabsorção radicular devido à esfoliação ou fatores contribuintes.